terça-feira, 31 de janeiro de 2006

O milagre da perfeição

Comovido até ao âmago, declara-vos o Dissoluto ter o complemento visual da mítica interpretação de Don Giovanni, que Giulini dirigiu em 1959.


(OPUS ARTE OA LS3001 D)

Num universo dominado pelo classicismo cénico, sob o signo do requinte e distinção, Muti confirma a sua autoridade (mozartiana) inquestionável, eternizando a mais extraordinária interpretação vídeo de Don Giovanni.

Allen aristocrático, Gruberová divina, Murray absoluta...

Outras considerações virão, depois deste rol de epítetos!

segunda-feira, 30 de janeiro de 2006

Recentração narcísica

(ainda a propósito da nova produção de Don Giovanni, em Paris)

Dissoluto feliz, pois que sobre ele não cessam de opinar!

Quando uma mise-en-scène dá que falar...


[Repito: virtuoso aquele que aguarda estoicamente por nobres palavras, quando de ALLEN se trata...]

Dissociação wagneriana

Em Paris, em território wagneriano, prossegue a inexorável clivagem: nos antípodas do belo traçado de Bob Wilson, a (parca) voz e a (desigual) direcção de Eschenbach.

Don Giovanni e a ubiquidade

Entretanto, prossegue o amor do dissoluto pelo seu reflexo (à la Narciso...): Don Giovanni chocante, em Paris - ainda que paradoxalmente defensivo; Don Giovanni "oferecido", em Madrid (em formato semelhante às dispensáveis "oferendas" do Expresso, dado tratar-se de um Giulini de segunda, em nada comparável ao primmo!!!); Don Giovanni requintado e (muito) teatral, em Milão, podendo ser visto em reprise - é certo -, mas em qualquer lugar!

Moral da história: "DON GIOVANNI É QUANDO UM HOMEM QUISER" !



[Allen fica para depois, qual cereja encimando um bolo, prometo!]

domingo, 29 de janeiro de 2006

O Don Giovanni

Il Dissoluto Punito apresenta-vos O Dissoluto Punito!



"Espelho meu, espelho meu, haverá Don mais Don do que eu?"

Sir Thomas Allen é o maior Don Giovanni que o final de século viu (depois de Siepi, claro está!).

Uma afirmação deste calibre, tão peremptória, carece de fundamento, não?

Carmen, la Sapatona

Segundo volume da colecção GRANDES ÓPERAS, esta semana, o EXPRESSO propõe um desastre...

A Carmen da Obraztsova é horripilante!
A evitar, a todo o custo! A menos que o público alvo seja da linha lésbica...


(Elena OBRAZTSOVA)

Há meia dúzia de anos, assisti a uma Carmen, na Bastilha, com a magnífica Borodina na pele da heroína. Apesar da soberania vocal desta criatura, a interpretação foi desastrosa... Não imaginei que pudesse haver pior!

Pois... eis que Elena Obraztsova prova que o mau é (quase) sempre transponível e ultrapassável, no pior dos sentidos!

Nunca ouvi uma Carmen deste calibre! Mais parece um camião sonoro: bruta, áspera, máscula e feia, sem brilho, nem sedução.

Bem sei que a mezzo russa era senhora de uma pujança e potência vocais estrondosas. Provavelmente, em Verdi, fez sucesso!

Pergunto-me em quem a dita senhora se inspirou para interpretar uma das mais magnéticas e sedutoras figuras da ópera?!

Confesso que a Carmen não é uma obra da minha predilecção - longe disso! Ainda assim, raramente resisto à lascívia e sensualidade que adornam e envolvem a personagem titular da ópera...

Felizmente, Carmen´s com os atributos descritos, não faltam: Berganza, De Los Angeles, Baltsa e Price, entre outras.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2006

Mozart Lírico puro

Severamente Punito seria um anónimo Dissoluto, se ousasse passar em claro sobre as comemorações do 250º aniversário do nascimento do seu criador, mestre MOZART.

Mestre, mestre, como te venero!

Como contribuir para as ditas comemorações, que perpetuam o génio singularíssimo de um criador que marcou, como poucos, o curso da história da lírica?

Na ausência de rasgos criativos, aqui vai uma reflexão sobre a voz mozartiana.


A ópera mozartiana, na sua essência, é uma arte de câmara, sendo avessa a grandes espaços; trata-se, portanto, de uma criação em tudo antagónica à ópera romântica, que convoca vozes grandes, potentes e ágeis.

Sendo uma ópera clássica, dos seus intérpretes, exige-se equilíbrio, harmonia, rigor e elegância. Nada de potência, extensão ou grande ornamentação!

Falíveis que são as generalizações, arrisco identificar a interpretação vocal mozartiana com o registo lírico puro que, aqui e ali, demanda um carácter, ora mais buffo, ora mais serio; eis, apenas, alguns exemplos: soprano lírico (Donna Elvira, Fiordiligi, Contessa, Susanna, Pamina, Zerlina, Blonde, Ilia), tenor lírico (Ferrando, Don Ottavio, Tito, Lucio Silla, Mitridate, Tamino, Pedrillo, Idomeneo), barítono lírico (Don Giovanni, Fígaro, Conte, Guglielmo, Leporello, Papageno, Don Alfonso).

Fora destas categorias permanecem personagens de tessitura mais grave, actualmente enquadráveis no domínio mezzo (Sesto, Dorabella, Cherubino, Cecilio) e baixo (Commendatore, Sarastro. Osmin).

Ainda à margem do lírico puro, encontram-se sopranos líricos ágeis (Konstanze, Giunia, Donna Anna, Elettra) e sopranos ligeiros (vulgo coloratura, como sejam a Rainha da Noite e Aspasia).

quarta-feira, 25 de janeiro de 2006

Tiraram-nos o tapete!

Eis uma péssima notícia para os amantes da lírica wagneriana que, como eu, tencionavam assistir à soberana produção de TRISTAN UND ISOLDE, da dupla Sellars / Viola, no Lincoln Center, em New York, eventualmente por escassos dólares...

Ao invés, as récitas terão lugar em Manhattan's Seventh Regiment Armory on Park Avenue.
A justificação é absolutamente anedótica!!!

Os bloggers americanos estão em fúria.

Solidário com a fúria e ira americanas, exprimo a minha luso-francófona indignação!!!

275 USD para assistir a uma récita???

ARE YOU NUTS?!


Dusapin: Faustus, the Last Night

O obra maior de Goethe - Fausto -, ao longo da história da lírica, tem servido de base a inúmeras criações (Gounod, Schumann e Spohr, entre outros autores).



O compositor francês Pascal Dusapin (1955 - ), que acaba de estrear a sua quinta composição lírica - Faustus, the Last Night -, em Berlim, na Staatsoper, ao invés de se basear em Goethe, apoiou-se em Marlowe, cujo Fausto antecedeu o do mencionado Goethe, para além de contar com contributos extraídos de outros textos.

A concepção heterodoxa da figura de Fausto, d´après Dusapin, parece enfatizar a dimensão mais catastrofista e negra da natureza humana.

A imprensa francesa tem dado algum relevo a este acontecimento operático, como atestam estas páginas do Le Monde, Le Figaro e L´Express.

Os curiosos poderão assistir à estreia francesa em Lyon (Março 2006) e na Ville Lumière (Novembro de 2006), no Châtelet.

Depois de oito minutos de aclamação, na estreia, outras reacções se seguirão. Presumimos...

À suivre.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2006

No Met, uma vez não são vezes!!!

A excepção que confirma a regra (da quase-perfeição) da mítica sala nova-iorquina.

Des nouvelles prises de rôle


(Nathalie DESSAY, au-delà de la colorature)

À tout moment, les amants de la lyrique sont prêts à se plier devant un talent de cette mesure.

Quel bonheur, d´apprendre ses nouvelles incarnations scéniques, parmi lesquelles figurent, notamment, Marie (La Fille du Régiment), Pamina, Lucia (pas Lucie !) et Violetta (rôle titre de La Traviata), la plus risquée d´entre elles, d´après moi !

demais desinteresses

- O que pensa dos resultados eleitorais?

- Rés-vés Travessa do Possolo, responde um blogger enlutado, com poucos motivos de Alegria.

domingo, 22 de janeiro de 2006

Defesas Maníacas

As ditas defesas constituem uma hábil e eficaz estratégia de luta contra a depressão.

Numa clara antecipação ao afundamento depressivo (político) que se avizinha, mercê de uma viragem que se adivinha, enveredou este blogger por uma linha de hipomania, em que o bem-estar se aliou às compras...

Vamos a factos: o surto saldou-se em mais um par de sapatos (botas, desta feita, de refinado corte!) e uma extensa e eclética lista de cd´s, que atingiram a cifra de 1005 - após a aquisição da dita lista... -, além de um (dispensável) jantar, chez Olivier à Bairro Alto, plutôt médiocre.

Dado que as águas teimam em não rebentar, o saldo de boa disposição mantém-se mediano, sendo que a dita lista de cd´s pesa em favor do humor eufórico, com o precioso auxílio das citadas botas (que não cessam de me envaidecer!).

Eis a repetidamente mencionada lista de cd´s:


(Le Nozze di Figaro, Levine)

(La Grotta di Trofonio, Rousset)

(La Clemenza di Tito, Kertész)

(Boulez conducts Ligeti)

(Sylvia Sass - Classical Recital, Gardelli)

(Die Ägyptische Helena, Botstein)

(Frederica von Stade Sings Mozart & Rossini Arias)

quarta-feira, 18 de janeiro de 2006

Wagner vanguardista...

Aqui há tempos, por altura do (meu subjectivíssimo) balanço operático de 2005, aludi a esta proposta de Der Fliegende Holländer.

Agora, vamos a impressões mais detalhadas!




(Der Fliegende Holländer - DG 00440 073 4041, dvd)

Nesta produção, Senta assume uma centralidade polémica e discutível, em tudo inovadora.
Desde a primeira hora, esta personagem afirma-se como epicentro de toda a trama, personagem de fronteira entre o mundo real, terreno e vil - o de Daland e seus súbditos - e o espiritual, dos valores supremos, a que o Holandês aspira ansiosamente, representando-os.

Kupfer coloca-a num registo absolutamente desrealizado, entre espírito e matéria, com um mandato impossível: consubstanciar a redenção do Holandês.

Impossível porque, invariavelmente, na psicologia wagneriana - que constitui o paradigma da problemática ultra-romântica - a morte, a tragédia e o pessimismo triunfam, num cenário marcado pela inexorabilidade da perda.

À excepção de Die Meistersinger, chez Wagner, a estrutura da trama é algo inflexível...

A este propósito, diriam os psicanalistas que a elaboração da posição depressiva constitui uma miragem, num universo marcado pela ansiedade de perda, bordejando a melancolia, que Wagner veste e adorna magistralmente, com roupagens românticas, longas, pesadas e dilacerantes.

Nesta produção, que à época fez furor e escândalo em Bayreuth - antecedendo a lógica de ruptura de Chéreau n´O Anel -, apreciei muitíssimo a dimensão plástica, que se encontra totalmente submissa ao traçado da insanidade de Senta.

O mor das vezes, esta figura paira, evitando fixar-se na terra ou no céu... A saída, que se vislumbra desde a primeira hora, é a morte, materialização possível - ainda que paradoxal...-, mas insuficiente, da almejada redenção.

Ao longo da representação, todo o cenário sofre mutações, conservando Senta a sua posição central.
As cores carregadas e o corte abrupto dos cenários sublinham um clima de asfixia e temor indesmentível...
Apenas Senta irradia luminosidade, numa clara alusão à sua missão...

A meu ver, esta produção afirma-se, ainda, pela soberba direcção de actores, absolutamente convincente.

Musicalmente, este O Navio Fantasma triunfa pela soberania - embora algo monocromática - de Simon Estes, baixo americano de aparência viril e robusta.
A voz escura e ampla irradia um colorido emocional muito próximo do desespero. A mímica, não sendo muito rica, é convincente.


(Simon Estes, na pele de Holandês)

O Daland de Salminen é primoroso dramaticamente!
Não entendo o que fez este notável baixo finlandês virar-se para Mozart, anos mais tarde, quando as suas interpretações wagnerianas se afirmavam pela excelência...
Salminen evidencia, com inegável mestria, a ganância vil e escabrosa que domina o pai de Senta. Até no riso é soberano!


(Matti Salminen, como Daland)

Quanto à Senta de Balselev... será, a meu ver, a mais paradoxal das intérpretes.
Se é verdade que triunfa na materialização da centralidade que o encenador lhe atribuíra, compondo uma insana de antologia, que domina toda a trama, vocalmente a sua prestação ronda a mediania.
A voz, que não é particularmente bela, conta com uma técnica hesitante e com meios limitados - falta de extensão e flexibilidade, sobretudo, além de um vibrato mal controlado.
Ainda assim, o seu colossal talento cénico coroam de glória a sua prestação.

As prestações de Nelsson e da orquestra pareceram-me correctas, sem mais.
Se é certo que a fluidez e a homogeneidade pautaram a prestação de ambos, certa é também uma notória falta de brilho e robustez dramática.

Em meu entender, não sendo este O Navio Fantasma primoroso no que à musicalidade concerne - haverá algum melhor do que o de Dorati (DECCA 455 904-2) ou mesmo o de Reiner (NAXOS Historical 8.110189-90), com Hotter e Varnay nos papeis titulares ? -, merece um lugar ao sol pela ousadia de uma produção absolutamente vanguardista (à época...)

***
Uma palavra de apreço a Henrique Silveira (do Crítico), pela simpática referência a este blog!
Quanto a Wagner, meu caro... temos a vida toda para dele falar...
Pode ser que nos encontremos pelas bandas de Bayreuth, Glyndebourne... ou Lisboa (por ocasião d´O Ouro do Reno, esta temporada), porque não!?

Ligeti perseguido pela terceira criatura, na Big Apple

Entrementes, Il Dissoluto Punito, irremediavelmente vitimado por francesite e operite crónicas, parte rumo a New York, na peugada de Ligeti...

O magnânimo húngaro, homem assaz experimentado em fugas, escapa-lhe, levando consigo a cenoura sonora, chamariz irresistível, que desencadeia na dissoluta criatura manifestações incontroláveis, além de absolutamente imprevisíveis...

Moral da história: ainda não é desta que o insano punito coloca as ganfias na mais-que-apetecível interpretação realizada por Salonen de Le Grand Macabre...

Punito enlouquecido - mas não vencido! -, por ora, resigna-se.

Melhores dias virão...


Jean Reno à l´opéra !!!



Ma tête n´arrête pas de tourner: Jean Reno, artiste d´un talent immense et incontestable, semble changer de métier, que pour une courte période.
Ouuuuuuuuf ! J´en suis soulagé !!!



Lui qui s´est consacré au grand écran, soit comme protagoniste de Léon, soit dans un rôle secondaire, certes (mais pas pour autant moins remarquable !), sur Le Grand Bleu, notamment, de nos jours, signe la nouvelle mise-en-scène de Manon Lescaut, de G.Puccini, à l´affiche à Turin.

Surprenante incursion dans un métier autre que le sien, d´autant plus que l´acteur se lance dans un terrain tout à fait différent de l´industrie du cinéma!!!

Comment s´en sortira-t-il ? Bientôt, on verra ce que la critique en dit!

segunda-feira, 16 de janeiro de 2006

Mal à l´aise...


(Villazon, dans le rôle-titre de Werther, à Nice)

Souvent, lors d´une prise de rôle, on doit faire face aux monstres que l´histoire nous impose.

Ceci dit, prendre la place de Thill ou Kraus, dans la peau de Werther, en France, en plus? Je m´imagine ! Qu´est qu´il doit être mal à l´aise, M. Villazon?

domingo, 15 de janeiro de 2006

365 dias depois...

...é tempo de comemorarmos 1 ANO DE EXISTÊNCIA BLOGOSFÉRICA!



Aos leitores deste espaço, um grande abraço!

Agradeço, muito particularmente à Teresa e a Carlos Amaral Dias que, cada um a seu modo, me incentivaram a embarcar nesta aventura pela lírica e demais interesses...

sábado, 14 de janeiro de 2006

Met: Futurologia...

Em torno das futuras programações das salas míticas, compreensivelmente, especula-se...



Como grande amante do Met, não passo uma semana sem consultar este magnífico reino do boato, rumor e especulação...

Não raras vezes, acertam na mouche!

sexta-feira, 13 de janeiro de 2006

A Paternidade (representação, em antevisão)

La Nilsson: obsessão...

o WASHINGTON POST redige o melhor artigo que li a respeito (do desaparecimento) da gloriosa Nilsson, de que me permito citar o seguinte excerto: «She conquered New York in the last days of 1959, singing a "Tristan und Isolde" at the Metropolitan Opera that was followed by a 15-minute shouting, stomping and standing ovation that became par for the course whenever Nilsson performed. The public demonstration after a 1980 Met performance of "Elektra," when Nilsson was in her sixties, went on for even longer. Almost a half-hour elapsed before the lights came up and we reluctantly agreed to go home. Never before or since have I seen an audience so hysterically excited -- and for all the right reasons.»

Curosamente, apenas os jornais americanos - WASHINGTON POST, CBS NEWS e NEW YORK TIMES (como ontem referi, neste post) - fazem referência destacada à morte desta Valquíria.

...triste demonstração europeia de apreço pelas suas lendas...

La Nilsson: eterno retorno...

Mas, se insistirem, perguntando-me o que levaria para uma ilha deserta, do vasto legado de La Nilsson...
remeter-vos ia para aqui...

quinta-feira, 12 de janeiro de 2006

La Nilsson: trabalho de luto

Regresso a ti, minha querida Birgit, desta feita para divulgar, aos que me lêem, a indispensável colectânea que possuo do teu legado interpretativo:

- Wagner



- Strauss



- Puccini



- Verdi




Vários


La Nilsson (1918-2006) - notícias na imprensa

Aqui e aqui podem ser encontradas notícias com alguns elementos biográficos da grande cantora sueca.


(Com Levine, no Met, em 1979)

Para outra ocasião, prometo uma lista das minhas gravações de eleição de La Nilsson.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2006

La Nilsson (1918-2006)

Så long, kära Birgit... För alltid, Nilsson

(Adeus, cara Birgit... Para sempre, Nilsson)



Querida Birgit,

Acabo de saber que partiste, para sempre. Confesso que há muito temia este momento, dada a tua avançada idade...

Não sei se alguma vez compreenderás quão importante para mim foste! Iniciei-me em Wagner pela tua Sábia mão, em Tristão e Isolda.
Böhm dirigia-te, em Bayreuth. Tinhas por companheiros Windgassen, Ludwig e Talvela. Corria o ano de 1966. A "yellow label" eternizou essa magnética noite.

Anos mais tarde, em Orange, tornei a ver-te na ópera homónima, desta feita com Vickers, na pele de Tristão. Böhm dirigia-vos, uma vez mais. Que soberania...
Parecia o crepúsculo dos deuses...
Contavas com 55 primaveras. O semblante acusava-as; a voz, nem tanto... A encarnação, essa era divina, majestosa, absolutamente assimilada, right under the skin (como dizias relativamente à Elektra, lembras-te?).

A tua retirada de cena materializou o fim da proveitosa geração wagneriana do pós-guerra. Depois de vós, deu-se o ocaso.
Hoje em dia, discretamente, como bem observaste, o canto wagneriano, qual Fénix, parece renascer, paulatinamente...

Aqui para nós, que ninguém nos ouve, verdadeiramente, acho que, à semelhança de Brünnhilde, retiraste-te, na expectativa de que um herói te beije e te desperte... Sê paciente, espera. Siegfried não passa sem ti e Wotan protege-te.
Não te imoles, peço-te encarecidamente!

E a tua Elektra, a última que interpretaste no Met, sob a direcção de Levine, em 1982, lembras-te? Dizias tu que dominavas a personagem... O Jimmy deu-te umas belíssimas dicas, não?!

Asseguro-te que em nossa casa, a tua presença perpetua-se.
O Tiago vai tomar contacto com a obra wagneriana, pelo teu folgo...
Pela minha parte, sabes bem que não passo sem as citada Isoldas, sem as Brünnhildes dirigidas pelo imenso Solti, muito menos sem a Salome e a Elektra que gravaste para a DECCA, com o maestro húngaro no púlpito.

Divina que és, apenas creio na tua retirada.
Não tardará muito para que, sob outros disfarces, regresses até nós, vis mortais.

Um abraço muito saudoso deste teu amigo, que te adora e perpetua a tua memória,

João



Hojotoho! Hojotoho! Hojotoho! Hojotoho!

Britten em Madrid: a (outra) inocência

A propósito da estreia da Sonho de Uma Noite de Verão, de B. Britten, no Teatro Real, em entrevista ao EL PAIS, o encenador Pizzi diz-nos, a dada altura: «(...)"la inocencia es clave en esta obra, la inocencia tiene un gran valor espiritual y por algo el autor decidió que el coro fuera un coro de niños."»

A temática da inocência, na ópera de Britten, tem um relevo indiscutível.
Pense-se, por exemplo, na personagem Billy Bud (da ópera homónima) ou na figura de John, jovem aprendiz de Peter Grimmes.

Ora mais, ora menos explicitamente, em ambas as óperas - porventura as mais relevantes, constantes do repertório lírico operático - a questão da inocência vs perversão / perversidade / desvio é da ordem da clivagem, no sentido mais psicanalítico do termo.

Ora, pelos vistos, na ópera Sonho de Uma Noite de Verão, o compositor inglês soube abordar e representar a dita inocência sob outro ângulo, não a identificando, nem com o masoquismo, nem com a vitimização.

sábado, 7 de janeiro de 2006

Divagações de um possidónio

Este blogger, acometido por um surto de superficialidade, consumismo e futilidade, à beira de abandonar os prazeres elaborados - mas etéreos - da música & literatura, rende-se às maravilhas da trivialidade!

Sinto-me agora infinitamente mais feliz!

Já posso dizer, no Golf, que «isto assim é uma imensa maçada, i mainãoseiquê», «os piquenos é um aborrecimento...», «Bóra lá todx pá beira da picina, comer imensa salada e vinho vêde!», «Tá ouvir, Martim? Vá falar àquele tio ali !», «Nazalturas de gandes apêrtos, nózémais "Valha-nos S. Judas-Tadeu!", qué o santinho da nossa devoção, tá a vêr?»...

A bem dizer, o meu filho vai passar a chamar-se Lourenço e os amiguinhos dele serão o Benárdo, o Tomás, o Salvador (um só? Nem pensar! Serão immmmmmensos!); a namorada ê a Caetana (nome mailindo, não há!), prima da Constança e amiga da Madalena...

Passaremos temporadas infindas entre a Praia-das-Maçãs e o Banzããão, lugares míticos, banhados por águas cálidas e tranquilas... longe, bem longe de "pessoas quase iguais a nós, que se cumprimentam com dois beijos e assim, brrrr" (pôbres, leias-se).

O Maria-Bolachas - qual Martinho da Arcada, qual carapuça! -, espaço de eleição para debates em torno de epistemologia (prizemplo), destronará o Botequim e quejandos, pela elevação das tertulias que aí proliferarão...


E quando estivermos fatigados, partiremos todx pasSão Martinho, qué um encanto, sempre banhado de sol, luz e assim!
...

Nem só de pão vive o homem...

... ou detalhes narcísicos...

... ou sob a égide do princípio do prazer ...

... ou les bourgeois, c´est comme les cochons ...

... ou aquém da metafísica ...

... ou, prosaicamente, ao serviço do conforto e da estética!